Em 2006 estive pela primeira vez em Londres com minha mulher Claudia. Fomos visitar minha enteada que havia mudado pra lá em 2005. Sabia que tinha um Museu do Cartum e ao comentar com o quadrinhista Sam Hart combinamos de ir até lá. Ficava na rua de trás do Brittish Museum... Estava situado em dois andares de um prédio muito simpático na rua Little Russel, 35. Estes dois andares cobriam 250 anos de muita criatividade e combatividade no humor britânico. O Museu foi fundado em 1988, mas está de casa nova e definitiva desde fevereiro deste ano, onde conta com a galeria Calman de exibições temporárias (onde estão expostos os cartuns Marte nos olhos deles), a exposição permanente de 750 originais que cobrem mais de dois séculos de Cartum, a de Histórias em Quadrinhos (andar superior), curso de Cartum e HQ (com o Professor Colin Pillinger) e a biblioteca com cerca de 3.000 livros e revistas (o BiraZine faz parte do acervo agora!) e a loja de venda de livros e cartões/cartuns.
As fotos da época estão na coluna que eu tinha no site Bigorna.
https://www.bigorna.net/index.php?secao=birazine&id=1149114977
Neste dia, o Sam se atrasou, o que foi algo incrível porque normalmente ingleses não se atrasam. Mas o fato é que ele foi no endereço anterior do Museu e gastou um tempo indo até o novo local. A visita foi excelente, o acervo já era maravilhoso, o museu tinha cursos extra-curriculares para escolas regulares e pude fazer as anotações pra coluna.
O acervo se divide em:
Era Dourada (1770/1830)
Trabalhos de John Nixon, George Woodward (que influenciou o traço do magnífico Searle), Henry Bunbury, James Gillray (publicado em livros de história até no Brasil), Raul Pry, Thomas Rolawdson, Richard Newton, Robert Dighton e os irmãos George e Arthur Cruikshank.
Revista Ilustrada (1830/1914)
Com a crise advinda de reformas políticas, o governo proibiu os cartuns satíricos. Mas mesmo com toda a censura, foi fundada a revista Punch, que abrigou os mais ácidos cartunistas da época. Em 1843, com a censura abrandada, o Parlamento criou um concurso de cartuns para decorar o prédio do Congresso (onde fica o Big Ben) e a exposição foi chamada de Sombra e Substância. John Leech e Tenniel foram cartunistas soberbos. Ape trabalhou com Leslie Ward (Spy), que foi o cartunista mais produtivo da revista Vanity Fair. Alem deles, marcaram essa época Charles Keene, Francis Goul, Brece Bairnsther e Will Dyson.
Tempos Modernos (1914/61)
Na Primeira Grande Guerra, os cartunistas ingleses abraçaram a causa da Tríplice Entente (Império Britânico, França, e até 1917 Rússia, e depois de 1917, EUA) que derrotou a Tríplice Aliança (Impérios Alemão, Austro-Húngaro e Turco-Otomano). A guerra causou o colapso de quatro impérios e mudou de forma radical o mapa geopolítico da Europa e do Oriente Médio. Nesta época brilharam traços que me lembraram o de muitos cartunistas brasileiros. Olaf Gullbransson (que lembra muito o traço do ítalo-brasileiro Lan), Leslie Illingworth, David Low (me lembrou a ótima Conceição Cahu) e Sidney Strube (o do genial Otavio, pai do Novaes), alem de Fougasse (com seus traços minimalistas) e William Robinson (com um desenho inventivo, usa e abusa da linguagem do desenho animado), Norman Thelwell (lindas aquarelas, me lembraram o Dacosta).
A Nova Sátira (1961/2006)
Aqui brilham monstros sagrados como Giles, Trog, John Glashan, Michael Folkes, Ronald Searle, Gerald Scarfe (que fez as animações de Pink Floyd, the Wall), Ralph Steadman (ambos com um trabalho similar, fortes pinceladas, cores exuberantes, crítica mordaz, caricaturas distorcidas, influenciaram muito o trabalho do brasileiro Cássio Loredano), Chris Riddell, Dave Brown, Charles Griffin.
Os Quadrinhos Ingleses (1884)
Mike McMahon, Jamie Hewlett, David Parkins, Dave Gibbons, Alan Moore, Kevin O' Neil, Brian Bolland, John Burnes, Frank Dickes, Charlie Peattie, Posy Simmonds, Steve Bell, John Ryan, David Loyd (V de Vingança), Brian Talbot e Hunt Emerson (Gato Firkin). Logo na escadaria damos de cara com Andy Capp (Zé do Boné) e Flo, astros das tiras britânicas em todo o mundo. Temos também trabalhos de estrangeiros como Carlos Ezquerra, Uderzo (Asterix), Sy Barry (Fantasma), Jesus Blasco, Jack Kirby, Chester Gould, entre tantos outros. Uma ode às tiras em quadrinhos do mundo inteiro.
Se não bastasse tudo isso, ainda tinha uma sala de vidro com uma instalação em 3D e com movimento chamada Self Going Golf Machine. O engenheiro e cartunista genial Rowland Emett projetou e construiu a engenhoca, muito engraçada e com todo tipo de surpresas (à la Professor Pardal). No site do Museu do Cartum vocês poderão ter acesso a mais detalhes da história do Museu, que me deixa feliz de novo ao ver que a história do Cartum e dos Quadrinhos é respeitada por órgãos públicos, por políticos e pela população. Levei algumas revistas com cartuns e quadrinhos meus e ofereci à Biblioteca do Museu: BiraZine, Front e algumas revistas de campanhas políticas como do candidato Adriano Diogo e a Biografia que fiz em Quadrinhos do então candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva.
https://universohq.com/materias/gibi-de-luiz-inacio-lula-da-silva-esta-online/
Hoje o Museu do Cartum mudou pro centro da cidade, no número 63 da Wells Street.
https://www.cartoonmuseum.org/
Nenhum comentário:
Postar um comentário